Essa peste vai embora,
Mas vem u'a praga pior.
A covid apareceu
E se espalhou pelo mundo.
O saber, que é fecundo,
Logo ao mundo socorreu.
A ciência então nos deu
A vacina, que é melhor;
Pois já sabemos de cor
Das vidas salvas outrora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
O vírus ninguém domina,
Pois não respeita fronteira.
Mas se vê uma enfermeira
Com a arma da vacina,
Vê logo que é sua sina
Ir dessa pr’uma melhor;
Nem tem tempo o vírus mor
Pedir paz pra pular fora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
A pandemia, é certo,
Com pouco vai se acabar.
Mas já vamos guerrear
Co’a praga que tá por perto.
Vem por terra e mar aberto,
Sem oposição maior,
Que sanções não dão um nó
No fuzil que apavora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Não é a Terceira Guerra,
Pois não tem doido lutando…
E se estão se matando,
Já na Ucrânia se encerra.
Mas seu efeito nos ferra;
Esta praga é bem maior:
E é a fome, que nem pó
Que se espalha mundo afora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Não bastasse a guerra então
Produzir tanta desgraça,
Com telhado de vidraça,
Vem Biden, de valentão,
Dizer que Putin é vilão,
Pra ninguém dele ter dó;
E impõe sanções pr’ele só,
Mas atingem é quem tá fora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Pra guerra não há razão,
E não se admite pretexto.
Fez muito bem Dom João Sexto
Fugir de Napoleão;
Ter deixado o valentão
Com a cara de bocó.
Bem na paz, esperou só
Pra voltar na melhor hora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
E não venham só dizer
Que é geopolítica a questão,
Pois aqui não há razão
Quando é questão de 'eu poder'.
Cada um quer é vencer
E se achar o maior.
Ninguém quer ser um Guaidó:
Um doidim por quem se chora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Rio Branco foi diplomata,
E do Acre se apossou.
Nenhum tiro disparou,
Nem ele usou de bravata.
Aprumou bem a gravata,
Negociou bem que só...
E a grana do meu suor
Fez La Paz feliz na hora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Isso é que é diplomacia!
Mas é o velho ditado:
‘Se não comprou o danado,
Foi porque deu mixaria’.
Mas quanta grana seria
Pra comprar Los Angeles só?
Por isso Tio Sam, sem dó,
Tomou-lhe o chão sem demora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Há bombas sobre Israel,
Sobre a Síria e o Iraque;
Mas como a de Nagasaki,
Não há mais rasgando o céu.
Que ninguém ficou pinel,
Nem tão mau que inspire dó.
Mas punha fé que um toró
Deus mandava nessa hora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Pra quem tem a bomba atômica,
E nunca pretende usar,
Que moralmente não dá,
Então vira u'a coisa icônica,
Que acaba sendo cômica,
Se é pra intimidar só…
Pois quem que a teme, major,
Se ninguém mais a estoura?
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Mas não adianta forçar
Pelo medo algum respeito.
A paz não vem desse jeito.
Precisa é dialogar.
Não produzir bomba H,
Que, se explodir uma só,
Vai detonar o paiol…
E vige Nossa Senhora!
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Pra fazer da bomba H
A ‘bomba do fim do mundo’,
Carece um estudo profundo
Sobre fusão nuclear.
A ironia é aplicar
O saber de um homem só
Pro fim do mundo, ou melhor,
Da ciência mesma, ora!
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
A guerra não é um jogo
Que o morto se ergue na hora.
Ora a mãe, a filha ora;
A Deus o pai lança um rogo:
Livrai meu filho do fogo
Do inimigo de Jacó!
Mas o pega em um lençol,
E sobre o corpo ele chora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Numa fração de explosão
Acontece o absurdo:
O coitado perde tudo!
Perde a mulher, filha, irmão;
Perde a paz, perde a razão;
E se tudo vira pó…
Sem esperança e só,
Morre em vida, e cai lá fora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Do Holocausto há judeus
Que na Ucrânia aportaram;
Mas jamais imaginaram
Outra vez dizer adeus.
Reviver, com dor, os seus
Medos de uma nota𝄞 só:
Dos canhões em grave dó...,
Que é o mesmo som de agora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u'a praga pior.
E a nota𝄞 que destoou
Da monotonia sonora
Repercute mundo afora,
Desde que a jovem a tocou:
Abre o piano, que sobrou,
Varre da memória o pó
Das ruínas da Jericó…,
E a nota𝄞 de amor aflora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Será que vão respeitar
Corredor humanitário?
Pra fugir ao meu calvário,
Sou forçado a me exilar;
Pegar a estrada e andar
Sem risco de virar pó,
Por algo em meu mocotó,
Tipo bomba que não gora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Nenhum dos beligerantes
Pensa sério no armistício,
Pois envolve o sacrifício
De algum poder tido antes.
Se do povo estão distantes,
Não recuam um passo só,
Nem vão jogar no bozó
A sorte pra um cair fora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Para Zelensky um recado;
É curto, mas não é grosso:
Tenha mais calma, seu moço;
Aja com muito cuidado.
Seu povo não é blindado,
Nem seu guerreiro é um Thor.
Também não é no gogó
Que vai pôr Putin pra fora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
E se este conselho presta
Pra Putin fazer a paz:
Sossega o facho, rapaz,
Que o mundo é porteira aberta!
Na conversa é que se acerta.
Estamos num barco só;
Se virar, viramos pó,
Com tanta bomba que estoura.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
E para Biden, por fim,
Uma palavra indignada:
Que moral tem sua Embaixada
Pra apoiar o arlequim,
Mas condenar o Putín?
Pois não foste aos cafundó
Invadir, matar, e não só…,
Como no Iraque, inda agora?
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Um magnata americano
Chamou o Putin pro pau,
Sem saber que o seu rival
É lutador veterano.
E cometeu um engano,
Que o russo é feito cipó,
Mina que deixa cotó.
E se o pega, já o tora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
E que diacho a Europa quer
Tentando armar o pierrô?
É a paz pelo terror
O equilíbrio que dá pé?
Mas dizem também que é
Que querem um lucro maior.
Se aproveitam do arigó
Pra vender fuzis da hora…
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
E o que o povo quer ver
É a OTAN isolada;
De preferência fechada,
Pra não ter mais o poder
De ameaçar sem temer
Nem pragas de faraó.
É melhor que reste só
Quem quer do mundo a melhora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Entre russos e ucranianos
Vamos torcer pela paz.
E só o povo é capaz
De desarmar os tiranos.
Pra quem causou tantos danos
A pena, disse vovó,
É Putin no xilindró,
E Zelensky numa tora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
A paz que é sustentável
Vem do bem que é plantado,
Do respeito conquistado.
Para tanto, é aconselhável:
Cada nação responsável
Se desarme a um tempo só,
Destrua e reduza a pó
Seu arsenal. Já é hora!
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Bem disse o Papa Francisco:
As grandes vítimas da guerra
São as crianças da Terra,
Porque correm maior risco.
É que o inimigo arisco,
Se a uns faz tornarem ao pó,
A muitos, pobres qual Jó
E refugiados agora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Essa praga já avança:
E é o vírus da fome.
Ó mal que vidas consome!
Efeito que a guerra lança;
Além da desesperança,
Com sonhos virando pó,
Pelo estilhaço ao redor
Da bomba que os devora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u’a praga pior.
Fome é dos vírus danados
Que matam até os helmintos,
Que não gostam dos famintos,
Pois são mal alimentados.
E um dos efeitos causados
É esvaziar o INCOR,
Que a gordura vira pó
Com a dieta que apavora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u'a praga pior.
Só quem sabe o que é a fome
É o pobre da cidade
Que vive da caridade
E das sobras que consome;
É aquele que não tem nome,
Que é invisível e é só.
E se não verte suor,
É porque a fome o devora.
Essa peste vai embora,
Mas vem u'a praga pior.
Disse o Papa, preocupado:
Parem com a guerra de orgulhos.
Nem dá mais essa de esbulhos,
Que o mundo é já demarcado.
Imitem o civilizado.
Sentem à mesa, afrouxem o nó,
Botem um disco de forró,
Não fique um cossaco fora.
Que essa praga vai embora,
Pro mundo viver melhor.
II - Décimas espanholas:
Guerra tem fome de carne
Sede de sangue, doutor
Música é o gemido da dor,
Do sofrer no desencarne
E antes que a guerra encarne
Precisa ser abortada
A todo custo evitada
Porque ela é genocida
Não há u'a nação vencida:
Todos perdem em luta armada.
A fome é filha da guerra,
Do desastre ambiental,
Da sanha do capital
Ou da pandemia, que ferra
Com a gente pobre da Terra.
E muita fome acontece
Porque o egoísmo cresce
E a ganância domina
Numa política assassina
Que limites não conhece.
Dizem que a "fome" é o tempero
Do prato da escol nutrida
Mas ela é só parecida
Com um jejum bem ligeiro.
Nem lembra o verdadeiro
Sofrimento de um faminto.
Deve ter nome distinto,
Pois na fome há desespero
Mas naquela há exagero,
Não há risco de ser extinto.
Com quem jejua o que ocorre
Com fome tem nada a ver
Primeiro, que é por querer
Não é louco ou tomou porre;
Depois, porque ninguém morre
Nem a carne se tortura;
Só se sente uma gastura
Que um sonrisal logo acaba.
E não demora ele baba
Com o cheirinho de fritura.
É melhor esclarecer:
O burguês não sente fome
Que isso tem outro nome
Pra vontade de comer
Pois quem pega a escolher
Qual comida vai pro prato
Só tem fastio nesse ato.
No fim, inda deixa um resto
Para, com um treinado gesto,
Chamar à mesa o seu gato.
A fome é uma condição
Que depaupera o organismo
Causando até raquitismo
Na criança sem o pão.
Sem forças pra erguer a mão
A caveirinha abre a boca
A sopa que toma é pouca
É rara, fraca, bem fina
Sem minerais, proteína,
Isso é uma tortura louca.
Quem tem fome, não dá mole
Come mesmo sem tempero,
Tipo pimenta de cheiro.
Come no seco e engole
E na panela inda bole
Pra raspar o que pregou
Depois que o arroz queimou;
Não cata pedra em feijão
Come tudo, lambe a mão
Papa o que o outro deixou.
Isso é o que 'fome' se chama
Só quem tem pode explicar...
Aliás, só faz mostrar
As costelas de pijama.
O olhar sem luz, sem a flama
Que ao semblante dá a vida
Só mostra que foi perdida
A sanidade geral.
Pensa mal e fala mal
Só geme e pede comida.
Rico não sabe o que é fome
Nunca viu uma mãe chorar
Quando o pai retorna ao lar
Com coisa que não se come...
Mas a família consome
Entre lágrimas, com esperança
Que dessa vez a criança
Vai comer sem saber nada
u'a sopa de rã minguada
Que vai enganar sua pança.
Se é que a 'fome' tem um gosto
É de angústia e desespero.
Que o faminto é sem dinheiro
Isso é o seu maior desgosto
Tá estampado em seu rosto
Essa grande decepção
Pois nunca tem condição
De adquirir alimento.
De tão magro, um pé de vento
Pode jogá-lo no chão.
Fome deprime e adoece
Acarreta medo e dor
O olhar é só de terror
Num corpo que só padece
A pele toda emurchece
Deixando os ossos pontudos
No corpo os órgãos graúdos
Vão dando péssimos sinais
Mas dos famintos os ais
Parecem que é a voz dos mudos.
*
Se há desastre ambiental
A fome também aumenta
Mas o rico se alimenta
Mesmo após o temporal,
Que já havia um sinal
E o ricaço estocou
Depois que tudo comprou
Deixando as feiras vazias,
Famintos passando os dias
Só com a fé que lhes restou.
A fome pode escalar
Com a mudança climática
E o que acontece na prática
É mais degelo polar
Que causa o avanço do mar
E provoca a inundação
De terras com plantação
E daí vem o tormento
Do desabastecimento
Que faz rarear o pão.
O desastre ambiental
Ocorre também no campo
Onde cobra, pirilampo
Lagartos e pica-pau
Morrem junto ao animal
Que cava embaixo da terra
O tatu que aí se encerra
Morre junto com a formiga
Tostada na sua barriga
Quando o incêndio desce a serra.
Aquecimento e tornados
Tsunamis e tufões
Ciclones e furacões
Desmatamento e alagados
Seca, campos inundados
Chuva ácida, poluição
E a desertificação
São problemas ambientais
Muito prejudiciais
Para a alimentação.
Um escritor dá este informe:
Metade da humanidade
Passa fome, de verdade;
A outra diz que não dorme
Porque sente um medo enorme
Da metade que não come.
Josué de Castro é o nome
Do autor dessa sentença
Que não é só uma crença:
São os perigos da fome.
Nenhum comentário:
Postar um comentário